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sexta-feira, 13 de janeiro de 2012


M A N I F E S T O
SOBRE A PROPOSTA DE REVISÃO DA ESTRUTURA CURRICULAR


Manifesto dos professores de Educação Visual e Tecnológica ao País


Em defesa da disciplina de Educação Visual e Tecnológica no 2º Ciclo do Ensino Básico e da sua valorização enquanto disciplina essencial e estruturante no currículo, pela promoção plena da Educação Artística e Tecnológica na Educação Básica e por educação integral para todos



A proposta de revisão da estrutura curricular do Ensino Básico e Secundário apresentada a 12/12/2011 pelo Ministério da Educação e Ciência (MEC) e que está em discussão pública, configura a eliminação da disciplina de Educação Visual e Tecnológica (EVT) do elenco curricular do 2º Ciclo do Ensino Básico (CEB) propondo a sua substituição pelas disciplinas de Educação Visual (EV), Educação Tecnológica (ET)/Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC), omitindo-se ainda a designação da área artística e tecnológica do plano curricular do 2º CEB. Esta proposta, caso seja posta em prática tal como é apresentada, atinge com grande impacto, o lugar e papel desta área educativa. Atinge também, e com elevada violência, a estabilidade socioprofissional dos professores, podendo perspetivar o desemprego para milhares de professores de EVT.
As consequências educativas desta alteração representam assim um enorme retrocesso relativamente ao desenvolvimento que a educação artística e tecnológica, consubstanciadas e consolidadas com a disciplina de EVT, têm vindo a apresentar nas duas últimas décadas. Representam também uma perda na qualidade do ensino na sua globalidade e um ataque às famílias, pois o aumento da dispersão curricular e a redução de docentes representa um elevado grau de irresponsabilidade, que a concretizar-se, será potenciadora de situações de complexa gestão do trabalho em sala de aula, dadas as características específicas em que se desenvolvem as aulas, a prática educativa da EVT e dos seus pressupostos que se consolidam na ligação destas duas áreas e não na sua separação.
A revisão curricular é a principal âncora do sistema de ensino, exige-se por isso um forte acordo político e social de natureza estratégica, pois aquela requer estabilidade e continuidade nas políticas. A reforma curricular não pode estar ao sabor de mudanças políticas conjunturais resultantes dos diferentes ciclos políticos e eleitorais.
A educação integral para todos, uma das razões de ser da escola pública, exige o desenvolvimento de uma literacia artística e literacia tecnológica capaz de promover o desenvolvimento de todas as potencialidades do ser que habita a criança, ao mesmo tempo que promove o desenvolvimento das competências necessárias para uma cidadania ativa e empenhada, desenvolvidas desde sempre nesta articulação de saberes corporizada da disciplina de EVT. A realização plena destas dimensões educativas requer uma área educativa/disciplina curricular onde finalidades, objeto e sobretudo o método, concorram para a sua consecução, como é o caso.
A natureza das situações de aprendizagem e experiências educativas em Educação Visual e Tecnológica requerem, como procedimentos fundamentais de ensino, a promoção de situações de natureza prática, nomeadamente: de expressão pessoal, práticas criativas, práticas experimentais e laboratoriais, práticas oficinais e práticas produtivas com transformação de materiais e objetivadas em produções materializadas fisicamente. Estas práticas inovadoras não se podem concretizar sem a plena integração destas duas áreas curriculares em pleno: separadas, perdem sentido, significado e relevância para os alunos desta faixa etária. O corpo das aprendizagens em EVT integra também a realização de ações práticas que requerem a operação em segurança de utensílios e ferramentas de trabalho.
A Educação Visual e Tecnológica, na atual configuração curricular e modelo de docência apresenta, na sua história recente, um contributo inquestionável não só para a inclusão e para o combate ao insucesso escolar pois é um lugar educativo de forte realização pessoal do aluno, mas também possibilita o desenvolvimento de estratégias educativas inter e multidisciplinares orientadas para a heterogeneidade dos públicos escolares. A EVT torna-se, assim, lugar de realização pessoal e social promotor de aprendizagens significativas e de forte inclusão escolar.

Assim, e pelo exposto, a APEVT e os professores de Educação Visual e Tecnológica insurgem-se contra esta proposta, apresentando à sociedade os seguintes motivos:

  1. Na proposta do MEC enfatiza-se a posição de defesa da redução da dispersão curricular. Ora, é para nós claro que a eliminação da disciplina de EVT e a criação de duas novas disciplinas (EV e ET), juntando-se uma outra área curricular (TIC) apenas aumenta a dispersão curricular;
  2. É incompreensível afirmar-se que o programa da disciplina de EVT se mantém e apenas são divididos os conteúdos – uns para EV e outros para ET, o que, para quem conhece a disciplina sabe que não é verdade. A mesma problemática surge quando se propõe dividir a disciplina e se mantêm manuais escolares;
  3. Há um claro desinvestimento nas áreas de formação artística e tecnológica sabendo-se que ao longo dos últimos 30 anos a carga horária destas áreas curriculares tem diminuído drasticamente ao ponto de ser agora uma proposta que “mata” qualquer desenvolvimento sustentado destes saberes nos nossos jovens;
  4. Não são apresentados quaisquer estudos realizados no nosso país sobre o impacto desta disciplina nos currículos do 2º CEB, ou mesmo fundamentações que sustentem a proposta de eliminação da disciplina de EVT e a vantagem da sua substituição por duas novas disciplinas;
  5. Esta proposta configura um desmembramento de uma disciplina de sucesso nas escolas, integradora dos saberes e que articula o saber e o saber fazer, tornando as aprendizagens dos alunos significativas e ignora a importância desta área curricular na escola, da sua ligação à comunidade educativa e do caráter inovador que a mesma apresenta para os alunos;
  6. Ignora-se, portanto, a formação de docentes nesta área curricular, o investimento nessa formação e mesmo os trabalhos de investigação académica e científica que nos últimos anos têm sido produzidos nesta área curricular e alguns ainda a decorrer;
  7. Vinte anos após a sua integração no currículo, com a disciplina finalmente estabilizada com professores do grupo 240, pretender justificar a sua separação com base na ideia de formações específicas em função das componentes da disciplina é um esbanjamento e uma depreciação à formação inicial ministrada pelas Escolas Superiores de Educação durante todos estes anos, acrescida pelo abandono de recursos físicos, materiais e humanos investidos durante duas décadas;
  8. Confunde-se deliberadamente que o regime de docência - par pedagógico em EVT, fundamenta-se na base das características práticas e experimentais da disciplina e não na formação dos professores em função das componentes estruturantes de EVT, não podendo ser isso considerado “um luxo” mas antes uma necessidade educativa e uma mais-valia para o sistema, pela natureza das aprendizagens proporcionadas, essenciais nesta faixa etária (9-11 anos);
  9. Ao propor a área de formação ET/TIC com 90 minutos semanais, sem que se entenda como serão distribuídas as cargas horárias, configura-se um cenário de desvalorização destas áreas do currículo: não há paralelo de uma medida destas e das suas repercussões, ignorando o caráter prático e experimental da ET. Crianças de 9, 10 ou 11 anos com disciplinas semestrais (que na prática funcionam apenas em 24 aulas, o correspondente a apenas dois meses de matemática, por exemplo)? Mas, mesmo que seja anual, com apenas 45 minutos semanais, não será um claro desinvestimento nesta área curricular? Que abordagens e aprendizagens consolidadas se podem realizar em apenas 45 minutos semanais? Saberá quem elaborou a proposta que os conceitos fundamentais e os próprios conteúdos da ET em nada são semelhantes com as TIC?
  10. No caso do 3º CEB, quando se propõe agora como disciplina obrigatória Educação Visual (com menos um tempo letivo), não existindo sequer a opção da disciplina de Educação Tecnológica ou outra, não será esta medida um desinvestimento nestas áreas de formação?
  11. Poderá esta proposta ignorar a mais-valia desta área no currículo e aquilo que permite no desenvolvimento global e integral dos alunos? O programa de EVT tem pressupostos integradores das matérias de ensino (Estrutura: a estrutura que se observa, a estrutura que se constrói; Cor: a Cor que se percepciona, a tinta com que se pinta; Movimento: o Movimento aparente que se expressa, o movimento real que se produz…);
  12. A abordagem da componente tecnológica em contexto de sala de aula exige uma metodologia em contexto de projecto, pois se assim não for, estamos perante actividades experimentais das ciências aplicadas ou simples exercícios de manualidades, o que constituiria um retrocesso na qualidade de ensino nesta área prejudicando, assim, a formação dos alunos;
  13. Em algum momento, aqueles que são de facto os principais visados com esta medida – os alunos, foram ouvidos e auscultados para que transmitissem a sua opinião sobre a disciplina e o que achavam da proposta apresentada que enuncia a sua substituição? Não serão eles os que primeiro deviam ser ouvidos e afinal acabam por ser os primeiros esquecidos?

Pelas razões apresentadas, defendemos a manutenção da disciplina de EVT no currículo. Pelas suas virtudes, pelo seu caráter inovador/integrador de aprendizagens, no sucesso das mesmas junto dos alunos, escolas e comunidade educativa, da sua força e daquilo que projeta na formação integral dos alunos. A defesa sustenta-se ainda na obrigação educativa e organizativa da docência da mesma ser realizada em par pedagógico pelas suas características, pela sua diversidade e caráter prático e diferenciador das restantes e porque não pode ser ignorada esta orientação na formação de qualidade a ministrar a todos os alunos, para uma educação integral, de qualidade e com enfoque naquilo que são princípios orientadores de uma sociedade inovadora. Não temos uma perspetiva imobilista, apenas não podemos concordar e aceitar uma proposta que não radica em pressupostos consistentes, em argumentos fortes e consolidados e, sobretudo, que ignorem o valor e o papel educativo e social da EVT no desenvolvimento integral dos alunos nos últimos 20 anos e que queremos continuar a desenvolver. Pela Sociedade, Pela Escola mas sobretudo: PELOS ALUNOS E UMA EDUCAÇÃO DE QUALIDADE.








APEVT | Associação Nacional de Professores de Educação Visual e Tecnológica
Porto, 12 de janeiro de 2012

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